DO QUE TENHO MEDO





Em minha vida jornalística tive oportunidade de fazer várias matérias que me tocaram, que me fizeram pensar no fato presenciado, mas nenhuma como aquela visita a um asilo.


Apesar do ambiente festivo pela visita programada da nossa equipe, pude sentir uma tristeza enorme no local.


Era como se uma nuvem densa tivesse descido naquele local, era quase tangível.


Era como se, de fato, pudesse tocá-la.


Os idosos sorriam para as câmeras, as faces enrugadas, os olhos úmidos, alguns quase cegos pela catarata, outros cegos, outros ainda em cadeiras de rodas, inválidos por motivos diversos .


Todos, ou quase todos, contaram suas histórias de vida e, nelas, ficou claro que a grande maioria fora ali deixada pelos parentes, pelos próprios filhos, incapazes de cuidar de quem lhes deu a vida, outros foram parar ali por não terem parentes ou amigos que lhes abrigassem.


Um sentimento estranho tomou conta de mim, um "não-sei-o-que" me oprimia o coração, que parecia querer saltar pela boca.


Não tenho medo da velhice, pois ela é natural.


Não temo as rugas que me sulcarão a face, elas representam os caminhos traçados.


Não temo os cabelos brancos, pois a neve em minha cabeça mostrará a experiência acumulada durante longos anos.


Não tenho medo, também, do meu corpo se curvar, pois o peso dos anos de trabalho estará ali refletido.


Não tenho medo das dores no corpo e o enrijecimento das articulações, que me impedirão movimentos mais atrevidos.


Não temo a perda paulatina da visão, pois as coisas que vi estão marcadas em meu pensamento, em minhas lembranças.


Não temo a perda de parte da minha memória, que poderá não responder como antes.


Não tenho medo sequer da morte, por saber ser ela apenas uma passagem para um outro mundo, na verdade, uma outra dimensão


O que eu temo, na verdade, é a solidão!


O que eu temo é o esquecimento daqueles que me são caros.


Porque uma coisa eu nunca vou perder, o amor por aqueles a quem sempre amei.


Só temo ser esquecido por aqueles a quem sempre me doei, sem nada pedir em troca.

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